BR Pharma decide pedir falência e ação cai quase 37%
Adriana Mattos
A Brasil Pharma, varejista de farmácias fundada pelo grupo BTG Pactual em 2009, decidiu pedir falência na Justiça, informou ontem a empresa em ata de reunião de seu conselho de administração. Foi chamada uma assembleia de acionistas, ainda sem data, para deliberar sobre o assunto. Mas como Paulo Remy, presidente do conselho, é o maior acionista, apenas seu voto já aprova a falência.
A ação da BR Pharma teve queda de 36,96% no pregão de ontem da B3, para R$ 0,87 – a menor cotação de sua história.
O pedido precisa ser protocolado na Justiça de São Paulo, onde tramita o processo de recuperação judicial do grupo desde janeiro de 2018. É comum que credores solicitem a falência em casos de empresas que não conseguiram sair da recuperação judicial. De forma inusual, este pedido de autofalência – partindo do próprio acionista – reflete a situação delicada do grupo nos últimos meses.
Em comunicado, o grupo diz que, por dificuldades com a venda de ativos do plano de recuperação judicial “não foi possível obter novos recursos para assegurar o cumprimento das obrigações previstas no plano, tampouco vislumbrar a continuidade operacional.”
“A administração identificou que a companhia está impossibilitada mesmo de manter o pagamento de honorários advocatícios e de acessar sistemas de informática e de controle contábil, o que lhe impossibilita gerenciar suas operações e realizar o pagamento integral da folha salarial dos colaboradores”, diz o comunicado.
Em abril, a BR Pharma tinha R$ 540 mil em caixa, para uma dívida de R$ 1,2 bilhão (em aberto com credores, sem contar o Fisco) e receita líquida de R$ 9,5 milhões em 2018 – em 2016, a soma chegou a R$ 1,5 bilhão. A receita tem sido gerada basicamente com royalties de franquias.
A BR Pharma não tem mais lojas próprias desde a segunda metade de 2018, apenas franquias. Hoje, o grupo soma um terço da base de pontos que tinha em seus melhores anos. São 425 franquias da rede Farmais, segundo dados publicados pelo grupo em maio, sendo 252 lojas ativas (com pagamento de royalties regularmente).
O grupo chegou a ter, no início de 2015, 1.214 lojas, sendo 725 próprias e 489 franquias, de cinco bandeiras: Big Ben, Santana, Rosário, Mais Econômica e Farmais.
Remy esteve nas últimas semanas buscando mais recursos com o BTG, que já vem liberando mensalmente pequenos empréstimos à empresa, mas não houve avanços nas conversas, diz uma fonte. O empresário comprou a BR Pharma do grupo BTG em 2017, pela valor simbólio de R$ 1 mil e ficou com as dívidas.
Na ata do conselho ontem, a BR Pharma faz menções indiretas ao BTG – algo que chamou a atenção de credores ouvidos pelo Valor. A BR Pharma informou que “viu-se obrigada” a registrar pouco mais de R$ 800 milhões em baixa contábil de ativos intangíveis no segundo semestre de 2017, portanto, meses depois de ter sido comprada pela Lyon Capital, empresa de Remy. A Lyon chegou a ameaçar devolver a rede ao BTG, por conta da situação crítica encontrada. Depois disso, empresas ligadas a sócios do BTG chegaram a liberar empréstimos à rede.
A BR Pharma ainda informou na ata que, após a aquisição pela Lyon, “foram verificadas contingências potenciais”, inicialmente estimadas em R$ 361 milhões, que na prática passaram alcançaram R$ 540 milhões.
A venda da BR Pharma foi concluída, em abril de 2017, no formato “porteira fechada” – após a conclusão do negócio, eventuais ajustes que aparecessem teriam que ser absorvidos pelo comprador. Um ano depois, em 2018, depois de a rede Mais Economica, da BR Pharma, ter sido vendida pelo BTG à Verti Capital, os novos donos acusaram a empresa de não colocar nos balanços o real passivo trabalhista. O BTG negava as acusações.
No passado, quando surgiram informações sobre a suposta insatisfação de Remy com a situação da companhia, fontes alegavam que Remy tinha informações sobre a rede e decidiu fechar a compra.
Na época da transação entre Remy e o BTG, foi feito um acordo de financiamento: o BTG Investments (BTGI), braço de investimentos proprietários do banco BTG, financiaria a compra da BR Pharma, a sua controlada indireta, para o empresário. Esse financiamento se deu pela aquisição de R$ 400 milhões em debêntures da varejista.
Depois disso, a dívida acabou sendo transferida à PPLA Participations, empresa criada por sócios do BTG, e a maior credora da rede hoje, com mais de 80% da dívida.
A BR Pharma ainda menciona o BTG em relatório de atividades publicado dias atrás. No documento, o grupo diz que o BTGI tem liberado mensalmente recursos para pagamentos de despesas rotineiras da rede. Afirma que “a operação vem sendo coberta por captações via DIP realizadas com o BTGI liberadas mensalmente conforme a comprovação de demanda”.
O DIP Financing (“debtor-in-possession”) é uma modalidade de financiamento para empresas em recuperação judicial, usado para pagamento de fornecedores, salários e gastos administrativos.
Procurado pelo Valor, o BTG não se manifestou. O comando da BR Pharma não foi localizado.
Apesar da recuperação judicial em andamento desde inicio de 2018, o processo está parado na Justiça, após divergências com credores. Apesar de a empresa informar que este fato atrapalhou a retomada dos negócios, advogados ouvidos entendem que a situação crítica da varejista reflete decisões passadas tomadas pelo comando, e não a suspensão do processo.
A BR Pharma foi criada em 2009 para ser uma consolidadora de redes regionais de farmácia. O modelo fracassou, após decisões operacionais erradas da gestão anterior, liderada por executivos indicados pelo BTG, em paralelo a um aumento de alavancagem, sem correspondente ganho de caixa e de sinergias (dentro do nível esperado) com fusões de redes ao longo dos anos. (Colaboraram Rita Azevedo e Ivan Ryngelblum)
Fonte: Valor Econômico