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Na educação, espaços e tempos são redefinidos

O pós-pandemia deve jogar luz no papel central da escola na sociedade, deixando mais claro o protagonismo das instituições no desenvolvimento e socialização dos alunos, enquanto a valorização do professor ganhará força, para a entrega de uma instrução de qualidade, nos próximos cinco anos. Essa é a opinião de nove especialistas em ensino público e privado, da educação básica à superior, ouvidos pelo Valor, sobre o futuro da educação.

Depois do impacto do fechamento das escolas no confinamento, a “reconstrução” do setor aponta também para a combinação de aulas presenciais e a distância, e um avanço significativo das ferramentas digitais nos métodos de aprendizagem.

A principal mudança conceitual no pós-covid é que a educação não é mais um lugar, mas uma atividade, destaca Lúcia Dellagnelo, diretora-presidente do Centro de Inovação para a Educação Brasileira (Cieb). “Ela não acontecerá apenas no tempo e no local físico da escola, mas em diferentes momentos e espaços da vida dos estudantes.”

Priscila Cruz, presidente executiva do movimento Todos pela Educação, diz que a luz amarela do setor vai continuar acesa por alguns anos: a expectativa é que a desigualdade de oportunidades de conhecimento entre os estudantes se acentue. “Teremos uma geração afetada pelos impactos da pandemia, especialmente entre os mais vulneráveis”, diz. Haverá perdas de aprendizagem e aumento na evasão escolar, afirma, em um cenário que já indicava queda no volume de recursos públicos para o segmento.

De acordo com relatório de acompanhamento da execução orçamentária do Ministério da Educação, realizado pelo Todos Pela Educação, o ano de 2020 se despediu com o menor gasto do MEC em educação básica, desde 2010. Foram R$ 48,2 bilhões no ano passado, volume 10,2% mais baixo do que em 2019 e o menor orçamento verificado em dez anos.

O ensino remoto, diz Priscila, por mais importante que seja no contexto da quarentena, tem limitações de aproveitamento e não atende a todos da mesma forma. Estudo realizado pelo Instituto Península, organização social criada para aprimorar a formação de professores, os principais desafios das aulas a distância, na visão dos docentes, são a falta de infraestrutura e de conexão dos alunos (79%) e a dificuldade de manter as turmas engajadas (64%).

Nessa fase de “escola em casa”, mestres e centros de ensino tiveram de se adaptar rapidamente e vão levar essas experiências para o período de retomada, avalia. “2020 e 2021 colocaram, de vez, a tecnologia no radar”, diz. “Mas é fundamental que haja uma ampliação da infraestrutura digital para todos os estudantes.”

Até lá, no curto prazo, a escola terá de resgatar os alunos que desistiram dos estudos e engajar os desmotivados, alerta Priscila. Trinta por cento dos matriculados em escola pública no Brasil corriam risco de largar os livros, em setembro de 2020, segundo o Todos Pela Educação. Para impedir o aprofundamento das desigualdades, será necessário desenhar instrumentos pedagógicos para a recuperação do aprendizado perdido, afirma. “Tudo isso só será possível com o apoio das secretarias de educação.”

Priscilla Tavares, professora da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV- EESP) e pesquisadora na área de economia da educação, pontua que a tecnologia será um motor das transformações na sala de aula, mas não agirá sozinha. A inovação estará nas práticas pedagógicas, diz. Salas virtuais e aplicativos podem ser úteis, mas só serão efetivos se promoverem engajamento, absorção de conteúdos e respeitarem ritmos diferentes de aprendizado, afirma. “O ensino remoto pode ser conveniente para alunos de pós-graduação”, avalia. Mas o principal insumo educacional continua sendo o professor. Precisamos implementar novas estratégias de formação docente inicial e continuada.”

Na visão da pedagoga Anna Helena Altenfelder, presidente do conselho do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), há uma tendência de maior aproximação na relação escola-comunidade. Com o avanço das tecnologias digitais, será preciso considerar condições subjetivas que podem interferir no resultado do ensino, como a organização do espaço domiciliar e o capital cultural das famílias, explica.

Ana Inoue, superintendente do Itaú Educação e Trabalho (IET), que apoia políticas públicas de ensino profissional, diz que o estudante deverá ser preparado para uma maior aproximação com o setor corporativo. “Vão aparecer novas frentes de trabalho que não estão mapeadas hoje”, afirma.

Fonte: Valor Econômico

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