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Executivas abrem espaço no mercado financeiro

Sérgio Tauhata

 

Juliana Mello, atual sócia e diretora de novos negócios da Fortesec, diz que no início da carreira foi preterida em uma vaga apenas pelo fato de ser mulher.

Juliana Mello, atual sócia e diretora de novos negócios da Fortesec, diz que no início da carreira foi preterida em uma vaga apenas pelo fato de ser mulher.

Houve nítida evolução no mercado de trabalho em termos de igualdade de tratamento entre os gêneros, ao menos, na última década. Porém, ambientes masculinizados e falta de chances para crescimento na carreira ainda são citados como entraves ao aumento da participação feminina em posições de chefia na percepção de mulheres em cargos de liderança no mercado financeiro ouvidas pelo Valor.

Algumas adversidades históricas parecem ter ficado no retrovisor. Discriminação, por exemplo, foi minimizada pelas executivas. “Nunca me senti, como mulher, sendo discriminada”, afirma Patrícia Bittencourt, que fundou a Guelt Investimentos junto com Ana Paola Guetta, após carreiras bem-sucedidas em instituições financeiras, como o BNY Mellon, banco Icatu e BBA Creditanstalt.

Paola Bonoldi e Magali Bim, co-gestoras de renda variável da Genial Investimentos, fazem coro às sócias da Guelt. “Acho que não existe mais espaço para esse tipo de atitude”, afirma Paola. “Nunca fiquei preocupada com essa questão de discriminação do gênero”, diz Magali.

Mas não faz tanto tempo, episódios de uma profissional ser preterida por ser mulher ainda frequentavam os processos seletivos. A sócia e diretora de novos negócios da securitizadora Fortesec, Juliana Mello, relata ter vivido um caso de distinção desse tipo no início da carreira, há 13 anos: “Na época, eu era a candidata final junto com  outro selecionado, mas a resposta que recebi foi que a empresa o escolheu por ser homem e aguentar mais pressão”. Apesar da experiência, Juliana afirma ter sido uma situação isolada na carreira. “Depois disso, acho que não existiu mais esse tipo de diferenciação.”

A discriminação pode ter até diminuído em anos recentes, mas ainda faltam oportunidades para as mulheres. Diversos estudos, como um realizado pela Spencer Stuart, que mostra uma participação feminina de apenas 9,4% nos conselhos de empresas listadas na bolsa, apontam para uma forte desigualdade a favor dos homens quando surgem oportunidades de ocupar altos cargos e posições de liderança.

“Os números mostram que a competência está sendo procurada em um só gênero, no masculino”, afirma Cecília Andreucci, que atualmente integra o conselho do grupo SolPanamby e tem passagens por vários outros colegiados. “Mas competência não tem gênero”, completa.

Para Cecília, historicamente os conselhos administrativos mantêm uma presença maciça de profissionais de finanças ou advogados. “Mas, diante de toda essa pluralidade e dos desafios que as organizações enfrentam, como sustentabilidade, inovação e atração de talentos, é importante que os conselhos tenham uma diversidade não só de gênero mas também de especialidades e até de faixa etária”, avalia. A conselheira lembra ainda que “uma empresa com boa governança tende a ter acesso mais facilitado ao capital e com menores taxas”.

Na experiência de Maria Teresa Fornea, CEO da fintech Bcredi, embora exista hoje uma menor distinção entre profissionais homens e mulheres em termos de reconhecimento, ambientes predominantemente masculinos, como acontece em grande parte das firmas do mercado financeiro, pecam ao não valorizar as qualidades de cada gênero. “Passei uma fase da minha carreira trabalhando em uma companhia hipotecária, era um ambiente muito hierárquico. O resultado comigo foi que, sem perceber, acabei me masculinizando, tanto nas atitudes quanto na forma de pensar. Acabei entrando na mesma espiral em lugar de enfatizar e trazer para a mesa o lado feminino positivo.”

Maria Teresa conta que, em grande parte, a fase empreendedora atual à frente da própria fintech está ligada a ideia de criar um ambiente genuinamente inclusivo. “As mulheres têm esse lado intuitivo para as coisas. Eu deixei de usar tudo isso ao longo da minha carreira. Então saí de um cargo de diretora em uma instituição financeira para ser empreendedora. Isso tem a ver com transformar uma cultura e com essa busca pelo espaço que valorize a mulher.”

A luta pelo empoderamento feminino, na visão de Patrícia e Ana Paola, da Guelt Investimentos, está ligada, na verdade, a uma visão de valorização da igualdade. “Dar chances iguais, independentemente de gênero, faz sentido em qualquer empresa”, pondera Ana Paola. A empreendedora ressalva ver ainda muito espaço para melhorar. “Acho que as executivas não chegam em cargos de liderança na velocidade que seria possível.”

Para sua sócia na Guelt, Patrícia Bittencourt, “a mulher está ganhando cada vez mais espaço, vejo gestoras, executivas de bancos e acho que a mulher tem de brigar pelo espaço dela”. Segundo a executiva, a meritocracia, em última instância, teria de prevalecer, mas, desde que haja chances iguais para os dois sexos na progressão de carreira.

Na opinião de Annali Duarte, chefe da área de serviços de transações globais (GTS), diversidade e inclusão do Bank of America Merril Lynch (BofA), ainda existe uma quantidade muito baixa de mulheres em posições-chave nas empresas. “Há um viés inconsciente, não proposital, mas existe uma tendência de o homem escolher um igual e talvez se fosse o contrário também a mulher escolheria outra mulher” nos cargos de confiança. “Eu particularmente acredito que, independentemente do gênero, todo mundo tem de ter chance igual, ou seja, é preciso tirar o viés inconsciente. Pela meritocracia, homens e mulheres teriam a mesma chance.”

Em relação ao futuro, Juliana, da Fortesec, é otimista e acredita que o ‘mindset’ está mudando e nenhum mercado está rotulado. “Falo na Fortesec que somos sócios complementares. A gente é complementar não por ser homem e mulher, mas pela bagagem que cada um trouxe”.

Fonte: Valor Econômico

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