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A JBS e as artimanhas fiscais

O espetáculo da delação e subsequente deserção da JBS, que trocou a confissão de uma multitude de crimes pelo direito de transferir a sede para fora do país, causou indignação entre os brasileiros. E colocou em cima da mesa um tema quase tabu: a otimização fiscal, modalidade olímpica das multinacionais.

Perfeitamente legal, e por isso diferente da sonegação fiscal, a otimização fiscal é engrenagem essencial da máquina financeira moderna. A rota de fuga traçada pelos irmãos Batista, por exemplo, é de uma banalidade desoladora.

Com a abertura da holding na Holanda, a JBS se tornará vizinha de centenas de multinacionais que se instalaram por lá em busca de blindagem legal e institucional.

À imagem da Irlanda e de Luxemburgo, outros suspeitos de costume, o país oferece uma rede grande e confiável de acordos de dupla tributação. É mais vantajoso investir no Brasil através da Holanda do que de um parceiro privilegiado como Portugal.

Os defensores da otimização fiscal veem nela um “mal necessário” da economia globalizada. Os críticos denunciam uma prática perversa e pérfida, além de ser profundamente antipatriótica

Numa tentativa de resgatar a credibilidade da União Europeia nessa questão, Emmanuel Macron, em sua primeira entrevista coletiva com Angela Merkel, designou a harmonização fiscal dentro do espaço europeu como prioridade do seu governo.

Uma ameaça pouco velada ao Reino Unido, que planeja tirar proveito da disparidade existente na União Europeia para reduzir seus encargos tributários e assegurar o estatuto de praça financeira de Londres depois do “brexit”.

Porém os governos que se insurgem regularmente contra a otimização fiscal também são os guardiões desse sistema.

Antes de assumir a presidência da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, interlocutor-chave de Merkel e Macron, conduziu enquanto premiê a transformação de Luxemburgo em centro de lavagem de dinheiro.

O pacato país de 500 mil habitantes, que tributa uma porcentagem ínfima dos dividendos, tem o maior volume de investimento externo da União Europeia.

Sem uma ação coordenada das autoridades da UE, os países-membros estão condenados a sacrificar a arrecadação tributária no altar da competitividade fiscal. Nessa corrida rumo ao abismo, quem ganha são as empresas, e quem perde são os Estados, da Europa e do mundo. As artimanhas fiscais, legais e ilegais, custam cerca de US$ 50 bilhões por ano aos países africanos, o equivalente do que recebem em ajuda e investimento externo.

Diante dessa constatação de impotência frente à manobra da JBS, resta a resistência cívica. O “tax shaming”, movimento que revela e divulga as manobras fiscais das multinacionais, deixou os mastodontes GAFA –Google, Amazon e Facebook– numa saia justa.

Incapazes de obrigar todos os empresários a pagar impostos onde produzem lucros, os cidadãos podem, pelo menos, através de manifestações públicas, sinalizar que tais práticas não passarão mais despercebidas e não serão esquecidas.

 

 

Fonte: Folha de SP

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